terça-feira, 1 de novembro de 2016

Aos Ferdinandos do Mundo

 

Alguém se lembra do desenho do Ferdinando? Ah, como eu amava quando esse episódio se repetia, e era uma pena que eles reprisassem o Ferdinando raras vezes!! Identifico-me tanto com o Ferdinando... ele amava as flores! :)

Às 05h30 perdi o sono e acordei com esse danadinho na minha cabeça. Lembrei da minha infância, dos tantos Ferdinandos do nosso planeta e logo vieram as tais das vaquejadas, touradas e matadouros martelando o meu juízo. Sim, porque ultimamente, depois da legalização do aborto, da eleição de Freixo ou Crivella, o que mais tenho ouvido falar é na tal da PEC 241 e nas vaquejadas.
Como tudo no Brasil, agora também virou disputa de opiniões ser à favor ou contrário às vaquejadas no país. E como tudo que parece sem resolução por aqui, não quis discutir muito o assunto, apesar de ainda me dispor a tentar dialogar sobre isso com algumas pessoas, por gostar de ouvir vários pontos de vista - curiosidade mesmo. Após argumentações acirradas sobre a legitimidade da realização das vaquejadas, aqui em casa houve até bateção de porta do quarto.rs 
Eu afirmo, e reafirmo, que sou contra qualquer forma de violência contra gente, contra os animais, contra as plantas... seja o que for! Eu penso que sempre existe uma outra alternativa para que não se sacrifique nada em nome dos interesses individuais, fazendo com que qualquer Ser desta Terra não seja denegrido ou imolado em prol da satisfação pessoal de muitos. Bom, aí me vi em mais uma contradição na minha vida. Sim, porque outro dia estava lendo um post em que eu me voltava contra a Copa do Mundo ser realizada no Brasil, um post de 2013, e em 2014 eu posava, nas redes sociais, em fotos com o Miguel no Estádio Mané Garrincha. Onde foi parar a minha lucidez e bom senso, além da minha grande revolta contra o sistema corrupto do mundo?! :/ Eu sou contraditória. Não hipócrita, mas me contradigo algumas vezes, quando mudo de opinião ou permaneço nela por razões sem fundamento. Eu também contribuo para o sistema de matança dos animais, pois sou beneficiária do comércio alimentício que propicia tanto sofrimento aos bichos. Eu consumo muita carne, queijo, leite e derivados de animais!!

Voltando às vaquejadas, touradas, matadouros etc, fiquei, então, me questionando por que eu ainda não parei de alimentar o sistema que sacrifica os animais, por que ainda não eliminei a carne do meu cardápio? Bem, aí, em minha defesa, eu digo que houve um tempo em que parei de comer carne, mais precisamente em meados de 2003, 2004, antes do Miguel nascer. Fiquei uns anos sem comer carne, ainda só no peixe, evitando fazer parte do "sistema capitalista", e confesso que nunca senti muita falta do alimento. Não sou tão carnívora quanto pensava ser. Voltei a comer todo tipo de carne quando engravidei, porque os médicos me convenceram que seria bom para o bebê e que ele precisava das proteínas desses alimentos. Desde então, nunca mais a cortei da minha dieta, apesar de não ser muito fã e ainda preferir o peixe! 
Aqui em casa minha mãe faz carne todos os dias, quer seja frango, quer seja carne vermelha. Já insisti mil vezes para comermos menos carne, somente uma vez por semana, mas é difícil criar novas regras numa casa que não é sua. A desculpa da crise também afeta a dieta saudável, "não dá para comer peixe sempre!". 

Outro dia, meu marido foi trabalhar e havia um protesto à favor da vaquejada,  na Esplanada do Ministérios, quando ele voltou me perguntou o que eram as vaquejadas e quais os motivos daquele enorme protesto. Eu expliquei, mas ele não satisfeito, e como adora ser contra o que penso, foi pesquisar na internet sobre o assunto, ler e ver alguns vídeos. 
Na hora do almoço, todos sentados à mesa, o assunto veio à tona e eu afirmava que precisávamos maneirar no consumo de carne. Eis que veio a tal vaquejada para a nossa conversa. Todos contra mim, disseram que era uma atividade válida, pois haviam várias formas modernas de preservar o animal, e entre outros argumentos, um deles o mais batido pelos defensores, era de que a vaquejada propiciava várias forma de empregos e acabar com ela, em meio à crise, acabaria com a fonte de renda de muitas famílias no nordeste e em outras regiões do Brasil. Meu marido ainda tentou argumentar sobre a preservação da cultura que rodeava o ambiente das vaquejadas e vindo de um país fiel à cultura, defendeu esse ponto de vista mais do que a relação vaquejada-empregos. Minha mãe, convicta do que falava, comentou que os próprios veterinários confirmaram na TV (tsc) que o "esporte" era legal e não havia mais dano aos animais, segundo os veterinários. Eu me ative a poucas pergunta para eles: quem paga o salário dos veterinários, o governo? Quem financia as vaquejadas? E quanto aos empregos, antes da vaquejada não havia outra forma de ganhar dinheiro no mundo, no país, sem que os animais fossem sacrificados pelo "esporte", pelo prazer de vê-los sofrer e pagar muito caro por isso?
Agora vejam, por que os veterinários seriam contrários aos fazendeiros, e não adeptos das vaquejadas, se eles próprios não fossem favorecidos pela prática dessa atividade?

A vaquejada gera muito lucro para muita gente, pecuaristas, fazendeiros, veterinários, artistas, entre tantos outros envolvidos, assim como o consumo desenfreado de carne, do qual faço parte como consumidora. É só pesquisarmos, nos informarmos mais sobre isso. Não se trata aqui de querer defender os animais em desfavor dos homens, mas precisamos ser justos, alguém já viu como são realizadas as vaquejadas? Não adianta espora de borracha, rabo artificial, colchão para que o boi não se machuque na hora que vai ao chão. Já tentaram me convencer do contrário, mas é muito surreal ter a vaquejada ainda como um "esporte" ou uma atividade de lazer, mesmo sendo geradora de renda e meio de sobrevivência de muitos!

Há muitos mil anos os homens arrastavam suas mulheres pelos cabelos, e isso era perfeitamente normal. No mundo de hoje é reprovável qualquer forma de violência contra as mulheres, mesmo em países que ainda permitem essa prática. No Brasil, apesar da violência absurda, e que parece não ter fim, a Lei Maria da Penha veio para proteger as mulheres de sofrerem agressões, de serem violentadas de alguma forma. Ou seja, a cultura mudou, pelo menos na teoria, os hábitos mudaram, existe um consenso sobre a violência contra as mulheres. Então, não me venha com a conversa sobre "preservação da cultura" porque essa também pode, e deve, se alterar em prol do melhor para o mundo como um todo, e aqui se inclui fauna e flora! 

Sobre formas de subsistência, empregos e sua extinção, como eu comentei com um amigo, não vejo como um problema sem solução, pois mesmo depois de uma Revolução Industrial, depois da invenção dos computadores, o homem continua capaz, sempre deu o seu jeito para ganhar a vida de um outro modo que não fosse aquele do qual já não era mais possível subsistir. Portanto, em meio à inteligência e poder de reinventar-se, somos capazes de encontrar outras alternativas para solucionar problemas como esse. É tudo uma questão de adaptação e boa vontade de muitos!

E sobre o consumo desenfreado de derivados de animais, pensando lógica e racionalmente, é inadmissível aceitar comentários tais como: "então não coma verduras ou legumes porque eles também sofrem ao serem retirados da terra!". Não se trata de modismo ou somente compaixão dos animais, mas sustentabilidade mesmo, para que evitemos a destruição excessiva do Planeta como um todo, para que pensemos um pouco mais em todo o ecossistema e não somente na vaidade do capitalismo exacerbado que nos conquista aos poucos, envenenando e destruindo o que de mais sagrado nos foi concebido, a natureza!  

A humanidade tem sempre uma desculpa para justificar suas ações impróprias. Todos têm as suas justificativas e até hoje não vi nenhuma respaldada no respeito, solidariedade e preservação das espécies em detrimento da proteção de interesses próprios, particulares, e materialistas. Legalizar o aborto, por exemplo, fora os casos previstos em lei, para justificar menos mortes entre as mulheres que o cometem e evitar crianças fiquem órfãs, desamparadas, é um modo de reforçar a irresponsabilidade individual pelos próprios atos e a irresponsabilidade estatal em não prover meios para a população evitar, ou prevenir, uma gravidez indesejada. Mas sobre esse assunto quero falar um outro dia.  
Legalizar vaquejadas é um meio de justificar a busca incessante pelo capital, em todas as áreas que abrangem a atividade, com a desculpa de empregabilidade e defesa dessa cultura no país. Se a gente quer falar em cultura, por que temos que deixar prevalecer sempre algo degradante, a ideia de defendermos formas de pensamento ultrapassadas que levam mais em conta a violência do que a libertação em si?  Violência, seja de que forma for, é uma forma de estagnação no tempo.

Até quando vamos jogar a nossa responsabilidade social, e individual, nas costas das crises, do governo, da pobreza do país, das condições de vida?  Pensando assim, os assaltos, os latrocínios, os assassinatos, a corrupção, entre tantos outros assuntos que nos amedrontam no Brasil, todos eles têm as suas justificativas, depende, sempre, da perspectiva de quem os defendem!

Minha mãe e meu marido disseram que argumentando eu não vou mudar o mundo, não vou mudar as pessoas. Eu disse que pensando tal como eles, era mais difícil mesmo mudar qualquer coisa. Se toda vez nos curvarmos à desesperança de um mundo melhor para justificar a concordância com o que está pronto e com o que dá preguiça, e trabalho, ser modificado, fica impossível qualquer forma de evolução. Ter um consenso dentro de casa, termos uma opinião contra todo tipo de violência, por exemplo, já é um primeiro passo, e isso se perpetuará entre nossos filhos e familiares, além, é claro, da necessidade de mudança de postura, mudanças em nossos hábitos, ser fator essencial para a transformação desse mundo. 
Quanto à descrença em achar que uma opinião, em milhões, não vale muito, fico com uma das frases que mais gosto de ouvir sobre a força e o poder do amor e da transformação: 

"Eu sei que o meu trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele o oceano seria menor." (Madre Teresa de Calcutá)

Por hoje é só, pessoal!! ;)


Por Helen de Sousa Waqas