Aos 45 minutos de completar 45 anos, vinda de mais um Dia das Mães conturbado, os questionamentos sobre estar vivo, o sentido da vida, e tudo mais que envolve ainda estar respirando, e por quê, insulflam uma mente na crise da meia idade, como diriam por aí...
Vou respitando e sobrevindo a esse mundo que não me permite ser quem eu queria ser, morar onde gostaria (porque não tenho um homem de culhão ao meu lado), estar onde eu deveria, vestindo as roupas em que me sinto confortável, bonita, onde me sinto pertencente a mim mesma. Sempre com medo da violência, do estupro, do vilipêndio do meu corpo e dos meus filhos. Devendo dar satisfação para todo mundo sobre os meus pensamentos, sobre os meus desejos, sobre os meus passos e atos, porque todos acham que eu devo obediência a eles. E quem são todos esses "todos"? As pessoas dos meios meios sociais de que faço parte, com quem tenho que experenciar em sociedade, para não ser considerada uma extraterrestre por não querer contato social. E, sim, passando uma imagem ingrata, soberba, porque não aceito mais ser desrespeitada e invalidada. Mas devo gratidão (e isso nunca neguei) a quem me colocou no mundo e permitiu que eu chegasse até aqui!
Aos meus filhos, eu sacrifico o meu bem estar, minha saúde mental, para vê-los felizes, morando confortavelmente, sem ter que lidar com o medo de dormir num ambiente permeado de raiva, medos, ratos entrando por debaixo do guarda-roupas ou correndo nas paredes inacabadas do quarto, janela com cheiro de porco 24h por dia, para não conviver com banheiros mofados, em estado precário, para não ter que se submeter às várias situações que vivi, mas que raros são aqueles que conhecem as minhas intimidades a fundo.
Para muitos, parece comodismo, parece falta de ambição. Muitos nunca saberão o sacrifício e valor de poder dormir ao lado dos seus filhos sem temer pela segurança deles, sem temer os predadores do sexo, da pedofilia, sem se preocuparem em dormirem cobertos ou simplesmente não dormirem com medo de alguém vir violentá-los, bêbados, na noite escura.
Ninguém vai sentir a dor de não ser tudo aquilo que esperavam, porque ninguém caminhou pelas minhas estradas, ninguém calçou os meus sapatos.
Para outros, estou apenas me fazendo de vítima porque sempre fiz e tive tudo o que quis. O que muita gente não sabe é que o valor da vida não está no material, mas naquilo que é imaterial, e que o tempo leva embora, na vida que não se vive com fervor, com amor, com carinho, com compreensão, com colo, com apoio... E é por isso que sou "tão pouco" para um mundo onde se vale o que se tem, mas tento ser TUDO o que posso para os meus filhos, a razão de eu ainda estar por aqui, vagando neste mundo másculo, injusto e pérfido, a depender de quem aponta o dedo...
É mais fácil julgar, eu sei, mas ninguém vai poder apagar da memória dos moleques a infância feliz, rica em experiências, as poucas e intensas viagens à Europa, America do Sul, ao lugar mais lindo do mundo: o nordeste brasileiro! Ninguém vai poder deletar a intenção da tentativa em deixar viva a célula da família, da presença paterna. E eles, meus filhos, podem até me julgar e dizer que eu deveria ter feito tudo diferente, como é usual e comum no dialeto dos filhos, mas nunca vão poder negar que eu tentei ser a melhor presença na vida deles!
Entrando para a terapia agora, continuo fazendo a minha parte para melhorar, por eles, para eles. E nada mais egoísta do que viver a sua própria vida, de acordo com seus desejos próprios, depois que os filhos chegam às nossas vidas. Por isso, eu ainda erro muito, porque sou passional demais, num mundo onde a razão deve vir primeiro, onde o dinheiro é mais importante do que o afago, o afeto.
Está tudo errado! O mundo está morrendo. As pessoas estão morrendo e matando o mundo. O ideial de mundo perfeito está completamente corrompido pelo consumismo exacerbado, a vaidade e a luxúria, o desejo pelo imediato, e inalcançavel pela grande maioria da humanidade.
E nesses 45´a completar 45 anos de vida, eu me sinto uma idosa na pele de uma mulher parda, de olhos verdes, cabelos multiéticos, mãe de um negro e de duas miscigenações entre ocidente e Ásia. Lutando ferrenhamente contra a hipocrisia e a falsa espiritualidade que me permeiam, e seguindo, ainda, com minhas convicções e ideais, que me fizeram ser a pessoa que não aceita ser morna nem ser mais ou menos, apesar da flexibilidade para lidar com muito da vida, como eu disse à minha mãe neste último final de semana: EU SOU TUDO e não sei ser menos do que isso!!!
Por Helen de Sousa Silva Waqas
Em 13 de maio de 2024