Em meio à rotina desses meus
dias tenho notado algo que já deixou de ser comoção e transformou-se também em
hábito: pessoas reclamando e solidarizando-se com problemas do mundo,
envolvendo meio ambiente, maus tratos aos animais, indignação pela violência de
uns contra outros, entre tantas outras ações que vêm chocando a sociedade. Mas
o que me impressiona, nesses casos, é a discrepância do dizer e do fazer. É
certo que devemos pautar nossos pensamentos nas melhores ações possíveis, mas
isso não quer dizer que tudo o que se diz por aí é de fato realizado. E não que
as pessoas não possam comover-se com o mal, claro que podem e devem, mas a
questão é: o que eu estou fazendo em prol da mudança dessa realidade cruel e
subumana em que se encontra o planeta?
É fácil compreender que é
inconcebível pessoas completamente egoicas, narcisistas, apontarem o dedo para
julgarem o comportamento de tantas outras quando elas próprias não tem moral
para isso. Eu vejo o tempo todo pessoas trapaceando, “dando um jeitinho” de se
dar bem em toda e qualquer circunstância, furando filas, ultrapassando e
cortando um alinhamento justo de carros, meninas de olho no namorado alheio (e
investindo pesado nesses olhares), pessoas que se aproveitam da boa vontade de
outras explorando o máximo que podem para se dar bem, para economizar, não
ficar no prejuízo; vejo pessoas denegrindo o trabalho de seus colegas, com
mentiras, falsidades, comportamentos retrógrados e animalescos; pessoas
enganando umas às outras nas ruas, usando e abusando da compaixão alheia, do
sentimento de solidariedade; vejo homens e mulheres traindo princípios morais em
nome da “grana fácil”, dos “dias de glória”; profissionais ou, eu diria,
antiprofissionais deturpando uma carreira inteira de médicos, enfermeiros,
professores, entre tantas outras, e tudo isso em favor de quê? De suas próprias
vontades, desejos, fantasias, caprichos...
Outro dia falava-se em algum
lugar que as pessoas estão se tornando melhores, devolvendo dinheiro achado na
rua, denunciando crimes... mas isso pode ser representado por uma parcela
mínima dentro da sociedade. Mínima. Então, como começar a falar em progresso,
em evolução, sem olharmos para dentro de nós mesmos, dos nossos lares, das
ruas, do nosso ambiente de trabalho, no tratamento que damos aos nossos filhos,
irmãos, pais, familiares, amigos e colegas? Parando para pensar profundamente
nos meus atos, no dia a dia, será que meu comportamento é de uma pessoa justa,
correta, idônea e moralista, qualidades que defendo com veemência? Ao apontar
meu dedo para o outro e julgar-lhe menor, impotente, incorreto, corrupto,
infiel, estou agindo adequadamente em prol do bem comum, deixando minhas
paixões e desejos em segundo plano para beneficiar também o outro?
A hora é de consertamos o mundo
aos poucos, fazendo, primeiro, aquilo que está ao nosso alcance, para depois o abarcarmos
por inteiro; e isso só será possível quando por meio dos pequenos atos fizermos
grandes feitos. Assim, fica a dica para quem ultimamente tem furado filas no
banco, para quem parou na terceira faixa de trânsito para deixar o filho na
porta da escola (não fazendo uso do estacionamento que lhe é de direito),
abusou de favores alheios sem ao menos retribuir a da ajuda dada; para quem já
tirou proveito de alguma situação em seu ambiente trabalho, prejudicando um
colega de rotina; bateu no peito para falar de amor, perdão, compaixão e brigou
todas as pessoas que o cercavam por causa de seus caprichos egoístas e suas
ideias petrificadas; e para aqueles que se dizem cidadãos de bem e conseguem
contribuir, indiretamente, por meio de seus atos pequenos e diários, para o
sistema falido entre governo e compatriotas, a violência, a fome e a miséria
que assolam este país.
Helen de Sousa
18 de outubro de 2012